sábado, 30 de novembro de 2013

O DEDO

Chegara em casa, irado. O celular na mão.
- Traíra!
- Olha os modos!
- Me lixo.
- Os vizinhos.
- Se mudaram.
Chuta a mesa. Pratas voam, falsas.
- Eu te segui.
- E aí?
- Eu vi tudo.
- E aí?
- A coisinha também viu.
- E aí? Não conheço coisinha nenhuma.
- A da esquina.
Vê cigarros. Aproveita o clima.
- E esses cigarros?
- São seus, debilóide.
- Não me chama assim. – Torce o braço do outro.
- Puto.
- Sou.
- Viado.
- Sou.
Puxa o revólver.
- Atiro?
- Atira.
- Eu atiro em você. Depois em mim.
- Atira.
Quando a polícia chegou, encontrou o chão já riscado com duas silhuetas humanas em torno delas. Elas só se encaixaram. Como? Não sei, só sei que nas carteiras estavam os velhos fantasmas e dois toquinhos de giz.
Na época de mulheres, chamavam-se Maria da Cruz e Creusa da Ressurreição.
Todos lavaram as mãos e no outro dia as paredes terminaram de cair, sobras de um cangaço doméstico.
Um papel ao largo com o seguinte poema confidenciava a alguém chamada...
No celular ligado, uma voz de atriz: 
... “Bela Floralva, se Amor
me fizera abelha um dia,
todo esse dia estaria
picado em vossa flor:
e quando o vosso rigor
quisestes dar-me de mão
por guardar a flor, então
tão abelhudo eu andara,
que em vós logo me vingara
com vos meter o ferrão....”


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